Na década de 1940 surge o Teatro Experimental do Negro (TEN) com o escritor e ator Abdias do Nascimento (1914-2011). Dentre as peças apresentadas ao público pelo TEN, destaco: Sortilégio (1957), escrita pelo próprio Abdias; O Filho Pródigo (1947), de Lúcio Cardoso; Terras do Sem Fim (1947), de Jorge Amado; Filhos de Santo (1949), de José de Morais Pinho e em 1950 o TEN estreia Aruanda, de Joaquim Ribeiros. Paralelo ao surgimento do TEN, Nelson Rodrigues entra em cena com uma nova dramaturgia, dentre elas “Os Comediantes”, que até o seu surgimento a produção nacional do teatro não refletia a realidade do povo brasileiro. Em 1946, com Anjo Negro, Nelson Rodrigues expõe o inconsciente e a privacidade da classe média com suas loucuras e traições.
Mas foi no Teatro Municipal de Lima no Peru que Abdias do Nascimento se deparou com o fato que o fez posteriormente criar o TEN no Brasil. A peça “O Imperador Jones”, de Eugene O´Neil, trazia um ator branco tingido de preto. Naturalmente, economista que era, Abdias não soube julgar a performance do ator em cena, mas entendeu que algo na peça não combinava. No Brasil na época de Otelo, o negro só teria voz e vez de forma caricata ou cômica. Jamais se conseguiria assistir uma peça como Hamlet, com atores negros.
Um dos objetivos de Abdias em suas peças era a de descrever a saga da luta de homens e mulheres negros, operários, empregados domésticos, funcionários públicos, etc., que se propunham resgatar, no Brasil, os valores da pessoa humana e da cultura negro-africana através do teatro.
O mito da democracia racial já não era mais suportado, quando inclusive na Semana da Arte Moderna (1922), o tema sobre as relações raciais fora negligenciado. O objetivo do TEN era de que o próprio negro tomasse consciência de sua situação na sociedade, sem que para isso precisasse tolerar passivamente seu papel de coadjuvante nas relações sociais em todas as instâncias.
Tarefa difícil, pois tal empreendimento demandava mudanças de pensamento, critérios e condutas, além das necessidades burocráticas e das negociações com o controle estatal para apresentação das peças. Estas, por sua vez, almejavam o distanciamento do negro, visto enquanto expressão do folclore e exotismos da indústria turística. A ambição artística era a de resgatar o legado da cultura africana no Brasil, longe do espetáculo luxuoso exagerado do carnaval e demais rituais, servindo apenas como elementos de exploração a serviço dos interesses das elites e longe das raízes do povo que o criou.
A grande questão de Abdias é a importância do teatro enquanto movimento social. Mesmo renegado pela sociedade brasileira e impedido por duas vezes em participar de festivais internacionais, o Teatro Experimental do Negro é considerado como vanguarda neste tipo de ação social, embora sua existência tenha sido limitada tanto pela censura governamental, quanto pela reação do público, acostumado que estava às peças convencionais. O TEN semeou uma discussão que permanecia em aberto: a questão da ausência do negro na dramaturgia e nos palcos de um país mestiço.
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